Delfim Netto (*)
O estudo do funcionamento econômico da sociedade pode ser convenientemente dividido em dois ramos: a macroeconomia e a microeconomia.
A macro procura entendê-lo e criar instrumentos para que seu administrador (o governo eleito periodicamente) possa produzir um bom equilíbrio interno e externo. Durante muito tempo os economistas acreditaram –e alguns ainda acreditam– que, com uma adequada âncora cambial (o “padrão ouro”), o sistema deixado a si mesmo (“laissez faire”) produziria “naturalmente” aqueles equilíbrios. A variável de ajuste “natural” era o aumento do desemprego e a redução do salário real, que se tornou politicamente inaceitável pelo avanço do sufrágio universal.
Mas o fato importante é que mesmo uma macroeconomia virtuosa não garante uma alocação eficiente dos fatores de produção disponíveis se não forem dados estímulos adequados aos agentes econômicos. Quem cuida do crescimento e sugere instituições e mecanismos que aumentam a produtividade de todo o sistema econômico é a microeconomia. Ela tem avançado dramaticamente desde a exploração do uso da teoria dos jogos, da teoria dos leilões e dos estudos sobre a formação de preços em mercados especiais, onde há necessidade de submeter à maior concorrência monopólios e oligopólios de forma a proteger os consumidores com bons serviços e “modicidade tarifária”. Esta aproximação da teoria com a realidade foi, justamente, premiada com o Nobel de economia de 2014 a Jean Tirole.
O governo Dilma chegou ao diagnóstico correto em 2011 quando anunciou que a aceleração do investimento público era a boa saída para a volta ao crescimento. Foi lento, entretanto, em entender que o sucesso das concessões de infraestrutura, por serem transferências de monopólios públicos para o setor privado, envolvem contratos necessariamente “abertos” que duram de 20 a 30 anos e exigem: 1) bons projetos executivos que especifiquem claramente a qualidade dos serviços que se espera delas ao longo do tempo; 2) a construção de leilões adequados –tarefa de profissionais especializados– para estabelecer a taxa de retorno e 3) agências reguladoras de Estado competentes e estáveis para garantir a integridade econômica e financeira dos contratos. Quando se nomeia um “companheiro de passeata” para uma agência de Estado aumenta-se o “risco” da concessão e, portanto, sua taxa de retorno.
É por isso que talvez ninguém tenha mais necessidade do que o governo brasileiro de aprender na obra fundamental do novo Nobel sobre a formação de preços em mercados especiais. A presidente Dilma precisa incorporar Tirole às suas leituras após domingo…
(*) ex-ministro da Fazenda
Fonte: Folha de S.Paulo – Opinião