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Gerente Geral de Regulamentação e Boas Práticas Regulatórias na Anvisa, Gabrielle Troncoso, concede entrevista ao Sinagências

A brasiliense e especialista em regulação da Anvisa, Gabrielle Troncoso servidora de carreira desde 2005 é formada em economia, com especialização em Administração Financeira, Economia da Saúde e Vigilância Sanitária. Após processo seletivo Gabrielle Troncoso ocupa desde abril, a Gerência Geral de Regulamentação e Boas Práticas Regulatórias (GGREG) na ANVISA. 

Na Agência, a servidora atuou ainda na Secretaria Executiva da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (SCMED) e trabalhou no Núcleo de Assessoramento Econômico em Regulação. Na entrevista abaixo, Gabrielle fala sobre o processo e as metodologias a respeito da Análise de Impacto Regulatório (AIR) da Anvisa, a Agenda Regulatória e os bons desafios e práticas a serem feitas para uma maior participação da sociedade neste processo. 

PERGUNTA: Senhora Gabrielle Troncoso, a senhora está à frente da Gerência Geral de Regulamentação e Boas Práticas Regulatórias na ANVISA. Fale um pouco da importância desse instrumento de regulação e, em especial, do trabalho desenvolvido na ANVISA pela sua Gerência.

Sra. Gabrielle Troncoso:  A Anvisa tem uma caminhada em práticas regulatórias há alguns anos. Desde 2008, a Agência possui um programa de boas práticas regulatórias e durante este tempo vem implementando, alterando e modificando no sentido de melhorar e aperfeiçoar tais práticas. Hoje já temos uma Agenda Regulatória consolidada, instrumento de planejamento regulatório. Seu principal objetivo é a transparência e previsibilidade da atuação regulatória da Agência. Ainda temos nesta linha da transparência e previsibilidade, a “Iniciativa Regulatória”. Ela constitui etapa obrigatória para avaliação da conveniência e oportunidade de atuação regulatória da Anvisa, promovendo a gestão, a transparência e a previsibilidade do processo regulatório. Então, para que a sociedade tenha conhecimento de que a Anvisa está naquele momento se debruçando sobre alguma temática, publicamos no Diário Oficial da União (DOU) uma iniciativa regulatória.

Seu objetivo principal é formalizar o momento do início daqueles estudos para uma atuação que é deliberada pela diretoria colegiada (DICOL).

A área técnica preenche o formulário de proposta de iniciativa com algumas informações relacionadas ao problema e questões que se pretendem tratar sobre a temática. Após, vai para a diretoria de regulação que pauta o tema na Diretoria Colegiada (DICOL), com um breve relatório de esclarecimento e objetivos, somente depois, se delibera pela abertura ou não daquela iniciativa.

Ainda temos consolidado a Análise de Impacto Regulatório (AIR). Todo tema quando é pautado na Diretoria Colegiada (DICOL) para uma deliberação que vai gerar um regulamento técnico, tem que passar por uma análise de impacto regulatório.

Temos um formulário com perguntas importantes a respeito da avaliação de impacto do respectivo tema ou proposta para análise da Anvisa dentro dos seus processos de trabalho, são perguntas na perspectiva de impactos aos cidadãos, setor regulado, Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e a própria Anvisa.

Tais perguntas induzem uma avaliação de impacto daquela medida para os principais agentes afetados e atualmente é o que está funcionando na Anvisa. Toda atuação regulatória é seguida do preenchimento destes formulários que tem todo embasamento técnico da análise daquele problema e das soluções propostas. Ao final esse formulário vai como mais um subsídio para a tomada de decisão dos diretores.

Ainda temos as Consultas Públicas, e as Audiências Públicas. Nenhuma RDC ou Instrução Normativa que tramita em regime comum é publicada no DOU sem passar por uma consulta pública.  Temos dois regimes de tramitação o regime comum e o regime especial.

O regime comum corresponde ao rito completo e se aplica aos processos de regulamentação em geral. O regime especial corresponde ao rito simplificado, aplicável para situações específicas, cujas circunstâncias ou natureza do objeto justificam, por razões de interesse público ou economia processual, a supressão de determinadas etapas do processo de regulamentação. Compreende situações de urgência ou de menor complexidade com baixo impacto para a sociedade. A grande maioria tramita pelo regime comum e isso é um instrumento importante no processo de regulamentação que está bastante consolidado.

2) A Casa Civil colocou recentemente em Consulta Pública uma proposta acerca da realização das Análises de Impacto Regulatório pelas Agências Reguladoras. Quais as contribuições que a experiência da ANVISA pode trazer para essa discussão mais ampla?

Sra. Gabrielle Troncoso:  A Casa Civil tem liderado um grupo de trabalho com a participação de todas as Agências Reguladoras, inclusive a Anvisa, que tem trabalhado e discutido nos últimos meses objetivando fomentar e desenvolver a capacidade do Brasil em promover a análise de impacto ex ante (antes de publicação da norma).

Esse grupo trabalhou em um diagnóstico sobre o que as Agências estão fazendo, suas práticas, instrumentos e métodos que foi denominado de inventário . A partir destes diagnósticos iniciou-se a discussão sobre quais seriam as principais necessidades para que o Brasil e as Agências Reguladoras desenvolvessem suas ferramentas e métodos para análise de impacto regulatório ex ante. Ainda realizou-se um workshop  com a presença de representantes internacionais que trouxeram experiências e fomentaram a discussão sobre de que forma as Agências Brasileiras precisam avançar para a implementação sistemática de uma avaliação de impacto regulatório robusta.

Após, esse grupo trabalhou na construção de um documento que atualmente chama-se Diretrizes de Análise de Impacto Regulatório e um Guia para Análise de Impacto Regulatório.

Hoje temos discutido a questão da Análise de impacto não apenas como uma ferramenta de comparação de alternativas regulatórias na perspectiva de custo e benefício,  mas, para além dela, tratamos a análise de impacto regulatório como um processo sistemático de gestão regulatória, baseado em evidências, que busca avaliar, a partir da definição de um problema, os possíveis impactos de opções disponíveis para o alcance dos objetivos pretendidos, por meio de métodos e ferramentas específicas.

É um processo de busca e levantamento de evidências que por meio de um racional lógico subsidia a tomada de decisão. É assim que temos entendido a análise de impacto regulatório hoje, com base inclusive, nas recomendações internacionais e guias da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Participamos ativamente da construção deste documento em encontros semanais. Todas as Agências contribuíram fortemente, cada uma com a sua experiência e vivência e toda a discussão foi muito rica. Esse processo foi muito importante para as agências pois também foi um momento de troca.

Acredito que após a publicação das diretrizes e do guia, as Agências conseguirão alavancar ações e melhorar os processos e ainda redesenhar processos com base nesses documentos que estão alinhados com as melhores práticas internacionais e com o que temos de referência dos países mais desenvolvidos na análise de impacto ex ante.

3) Como a ANVISA está se preparando para médio e longo prazo enfrentar o desafio de realizar Análises de Impacto Regulatório nos temas por ela tratadas?

Sra. Gabrielle Troncoso: Isso é um processo de aprendizado. A Anvisa já tem trabalhado com a análise de impacto regulatório ex ante, há alguns anos. Porém isso não quer dizer que todos os nossos processos tramitam com uma avaliação de impacto robusta. Ainda precisamos avançar bastante. Faz-se necessário disseminar cultura, e  capacitar servidores e tomadores de decisão para que se enxergue valor neste instrumento.

A GGREG tem um papel de induzir esse desenvolvimento. É importante  desenhar e redesenhar os processos e as etapas, construir guias e realizar capacitações. A gerência também tem um papel de convencimento da importância deste instrumento para o processo de tomada de decisões da Agência. Esse é o grande desafio que temos e estamos muito dedicados para isto, para que de fato nosso processo da análise de impacto espelhe essas etapas.

Essa ideia é o que precisamos fazer em médio prazo na Agência e isto é um processo contínuo com capacitação, disseminação e mudança de cultura, pois estas questões não ocorrem dentro da GGREG e sim nas diferentes áreas da Agência que permeiam este processo ao longo da sua construção. Isso precisa estar incutido em todos os especialistas, técnicos e decisores envolvidos neste processo.

Outra coisa importante é que a AIR não substitui a decisão do tomador de decisão, ela subsidia, com as evidências, sinalizações acerca do que é o problema e a melhor forma de trata-lo, mas a DICOL é quem toma a decisão e ela pode levar em consideração outros elementos para além do que está sendo mapeado na análise de impacto regulatório.

Então nosso desafio é neste âmbito, em redesenhar o processo, oferecer métodos e ferramentas, e acima de tudo promover conhecimento. É um trabalho que estamos nos preparando para que no início de 2018 já tenhamos o novo modelo funcionando na Agência.

4) Como está a capacitação dos servidores da área? A capacitação nesse tema chega aos demais servidores da Agência? Mesmo aqueles que estão nos postos dos portos, aeroportos, fronteiras e recintos alfandegados? 

Sra. Gabrielle Troncoso:  Outro desafio. Estamos na fase de discussões do plano de capacitação para o próximo ano. O Plano de capacitação prevê, não somente ações para qualificar a equipe técnica da própria área de regulamentação que precisa cada vez mais se apropriar de toda esta temática com uma profundidade maior, mas também de capacitação de todos os servidores da Anvisa e neste âmbito o desafio é grande, porque temos não somente os servidores da Anvisa lotados na sede.

Temos uma proposta de cursos e atividades no auditório e instalações da Anvisa, mas também precisamos desenvolver mecanismos para atingirmos os servidores que estão nos portos, aeroportos e fronteiras. Temos demandas e estamos trabalhando alguns vídeos e materiais para ficarem disponíveis no site da Anvisa. Algumas vigilâncias sanitárias estaduais e municipais também têm sinalizado interesse em conhecerem a temática e tratar sobre as consultas públicas, participação social, processos de regulamentação e impactos regulatórios.

Nesse sentido temos trabalhado juntamente com a Gerência-Geral de Gestão de Pessoas e com a Gerência-Geral de Coordenação e Fortalecimento do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária.

5) Quais as formas pelas quais os servidores podem participar do debate e da construção da alternativa regulatória que será adotada pela ANVISA? 

Sra. Gabrielle Troncoso: Todo esse processo de AIR, o que inclui as  etapas de identificar o problema, entender as causas raízes daquele problema, estudar quais são as opções para se resolver o problema, tem como pressuposto a construção a partir de tomada de subsídios e consulta aos principais agentes afetados. Neste contexto não estamos falando apenas do setor regulado, falamos da sociedade, vigilâncias sanitárias estaduais e municipais, e servidores da casa. Planejamos neste novo modelo, a disponibilidade de ferramentas para que as pessoas possam conhecer os instrumentos e métodos para realizarem este diálogo.

Para além da consulta e audiência pública, existem outros instrumentos e métodos que permitem a realização dessa participação, como por exemplo workshops, grupos focais, consultas dirigidas, formulários com perguntas específicas para grupos específicos que permitem a coleta de informações e subsídios para a construção de todo este processo. Isso envolve não somente o setor regulado, mas a sociedade e principalmente os servidores da Anvisa.

A diversidade do escopo de atuação da Anvisa é muito ampla e a depender do problema regulatório que se pretende resolver, pode-se ter a necessidade de consulta a diferentes públicos, e mecanismos distintos para atingir cada grupo.  A ideia é disponibilizar métodos e ferramentas para que as pessoas entendam que podem 26lançar mão de diferentes métodos e instrumentos e escolher o que for mais adequado para o caso. Acreditamos que é neste contexto que iremos envolver mais pessoas internamente e externamente.

6)  “Como a Agenda Regulatória da ANVISA tem procurado refletir os interesses da sociedade?  Quais os destaques dessa Agenda? 

Sra. Gabrielle Troncoso:  O processo de construção desta Agenda Regulatória envolveu algumas etapas. Trabalhamos com a lógica de instigar as pessoas a discutir a atuação regulatória a partir dos problemas regulatórios. No momento de consulta pública da Agenda Regulatória, ao invés de perguntar para a sociedade: “Quais os temas que a Anvisa precisa atuar?”, nós optamos por perguntar: “Qual o problema que a Anvisa precisa tratar?”. A forma de diálogo com a sociedade foi diferente induzindo a cultura de atuar e explorar a identificação de problemas. A Agenda Regulatória 2017/2020 foi construída a partir de um amplo processo de diálogo com a sociedade. Foram mais de 106 dias de processo de participação social. Tivemos diferentes etapas de diálogos setoriais, consulta pública aberta e diálogos internos com as áreas técnicas. Todo esse processo teve a abordagem com foco na identificação de problemas. Os participantes puderam se manifestar em relação aos problemas e apresentarem dados e evidências. Assim, desde a construção da agenda, estamos com esse olhar em buscar evidências que nos auxiliem no processo de construção da atuação regulatória.

A construção da Agenda passou por consulta pública ampla e irrestrita e qualquer pessoa teve condição de participar, foram formulários simples, e as pessoas puderam se manifestar de modo usual.

Contudo, temos um desafio muito grande. Os serviços e produtos que a Anvisa regula são responsáveis por aproximadamente 23% do PIB. Estamos falando de serviços de saúde, hospitais, clínicas, portos, aeroportos e fronteiras, medicamentos, fiscalização, inspeções, entre outros. Assim construir a Agenda Regulatória da Anvisa é um grande desafio e atingir o nosso usuário, mais ainda. Fazer uma consulta pública não é necessariamente conseguir dialogar com toda a sociedade. Normalmente o percentual de participação é mais concentrado no setor regulado que são os que mais se manifestam, seguidos da academia, dos profissionais de saúde e de alguns grupos da sociedade civil organizada. Precisamos dialogar mais e melhor, e trazer a perspectiva do cidadão neste processo de construção.

Outro grande desafio é tratar a questão que é técnica com uma linguagem mais acessível e coloquial para que qualquer pessoa possa entender e se manifestar. Essa também é uma preocupação que temos o tempo inteiro, não somente na construção da agenda, mas em todas as etapas do processo que envolve a atuação regulatória.

7) Dentro deste contexto e de temas voltados para as Agências Nacionais de Regulação, quais você acredita que são importantes serem debatidos no âmbito do Congresso Nacional?

Sra. Gabrielle Troncoso:  Temos apoiado bastante a tramitação do projeto de Lei das Agências. A proposta em tramitação dispõe sobre a gestão, a organização e o controle social das Agências Reguladoras e aborda temas como a Análise de Impacto Regulatório. Neste sentido, avalio que a proposta traz muitos elementos que apoiarão o desenvolvimento e melhoria da qualidade regulatória das Agências (esse é um tema que eu pessoalmente acredito que tem que avançar). Acredito que as Agências Reguladoras terão um ganho muito grande com a publicação da lei.

Fonte : Ascom/Sinagências